30.3.10

Um estranho perfeito

Um estranho perfeito. Entre todas as trevas um pouco da minha alma pergunta muitas coisas. Sou estranho a mim mesmo, aquele que olha constantemente no espelho procurando cicatrizes, memórias, laços antigos, talvez até um rosto familiar. Um sem rosto. Penso nos que morreram no Holocausto, penso em cada palavra dita no mundo, e em cada gesto. Era uma vila perdida no meio do deserto do Atacama, ocas em formato cônico com suas portas viradas para o Oeste, eram os Chipayas. O chefe da-me um pirez de barro com um líquido vermelho de gosto esquisito, ele diz: - Beba. Um estranho perfeito. Nas trevas, ainda procurando, havia outra pessoa me olhando. As ruas estavam desertas naquela hora da manha. Ele estava parado me encarando, tinha olhos brilhantes e um sorriso puramente esquisito, um paradoxo entre mim e o nada pois, havia um certo nada naquilo tudo. Seu andar, seu falar, seu rir, era eu quem estava ali parado com olhos brilhantes. Ele dissera que controlava meu futuro e que o livre-arbítrio era uma mentira como qualquer outra. Ele dissera que eu não tinha muito tempo e tristemente longo estaria longe de novo. Me estendeu uma lata de Coca-Cola e disse: - Beba. Um estranho perfeito. No ninho das ideias, na loucura perdida (ou pedida), nos gritos eufóricos das crianças, nos ratos e nas baratas... Alguem acabou de ficar milhonário. No ninho das ideias, perdido com o teclado nas mãos, com o mouse ali parado me encarando. Ele disse: - Rhuan! Tu não sabes nada! Eu digo: - Tudo é fato, nada é verdadeiro, e você cale-se pois é inanimado - e a noite brilha então com o silêncio. O que me controla, a minha vida que esta ai pairando no ar. Ouço latidos e vejo o que é. Um cão me encara, ele tem olhos brilhantes, tem um vasilhame na boca. Pergunto se ele é a morte, não há resposta, pergunto se ele é a vida, não há resposta, pergunto por que me sinto um completo estranho em tudo e em todos. Pergunto o por quê das coisas e o real motivo de tudo. O vasilhame cai, a água cai porém sobra um pouco. Ele me olha e diz - Beba. Um estranho perfeito.

21.3.10

A menina e a chuva

Ela estava esperando na chuva por muito tempo, a chuva já caia a muito tempo. Quem ela esperava? Sua resposta estaria na chegada do suposto, ele falou que viria, ele falou que chegaria em breve, talves estivesse morto e ela não sabe. Talvez ela tenha morrido. As águas escorriam pelos bueiros, o deserto negro das ruas naquela noite faziam seu triste coraçãozinho tremer a cada batida, ela esperaria ali por uma vida inteira, talvez fosse sua última chance de dizer que ama à alguem ou que odeia o mundo, e se chovia não teria medo da chuva de novo. O domingo amanheceu cinza, as núvens dançavam, pareciam naves estrelares em guerra do qual se esfarelavam quando uma tocava a outra. Era um domingo triste pois a alegria talvez tenha ficado no sábado, o sábado fora feliz até as 18:00. Ela escreveu tudo isto num diário. Ela esperou o dia inteiro, choveu o dia inteiro. Sempre acreditei que a chuva fosse as lágrimas dos anjos mas quando crescemos passamos a não acreditar em anjos, quando crescemos nossos aniversários começam a ter menos pessoas já que nossos amigos também vão sumindo aos poucos. Lentamente ela se vira com 36 anos, casada e com aniversários cada vez mais vazios. Com 70 anos, num asilo, não havia mais bolo, velas, nem ar nos pulmões. Acordou as 8 da manha com um susto, sonhara. O domingo se fez tão triste, mas triste que o normal, os anti-depressivos já não faziam mas efeito porém acreditava que estava livre das tristezas naturais do homem, que alias, é uma dor que doi no peito. Pode rir agora. Olhou toda a paisagem no ônibus. Estava molhada, era o último ônibus da noite, o motorista era seu amigo, o mundo não. Mesmo se as estrelas caissem, ela não se sentiria feliz ao certo. Mesmo assim quando chegasse em casa, tirasse sua roupa, deitasse na cama ainda molhada da tempestade que passou ela acordaria no sábado, ela acordaria todas os dias da semana, ela acordaria sempre e mais e mais e mais e mais vezes. Ela esperou na chuva por toda a eternidade e a chuva estara nela por toda a eternidade.

17.3.10

continuação.

As águas pareciam mais frias naquela manha. O mar não deixava a áreia se acomodar, a água fria queimava minha pele, as cinzas núvens só ameaçavam a chuva. As janelas eram lúcidas eu é quem era o louco! Em toda minha vida não pude ver as estrelas direito, todas as paisagens que poderia ver em pequenos fragmentos de dias deixei trancorrer por minhas mãos, quem sou e o que faço neste mundo devasto? Sou aquele mar gelado. Nevava em algum lugar do mundo. Eu podia ver aquele russo andando no deserto frio da Sibéria, tinha um pesado casaco e uma bebida quente, tentava chegar em sua barraca mas a neve fofa impedia-o de chegar mais rápido. Sabia que morreria alí se nevasse, sabia que estava nas mãos de sua agilidade, sabia que faria parte da paisagem ao morrer. O frio vem da alma. Quem gritará? A coragem cresceu no meu interior, mesmo sendo duas da manha o grito saiu tão forte que os cachorros latiram. Não era angústia, era raiva, raiva de mim e de um mundo que não se situava, raiva de uma foto em preto e branco tirada há tanto tempo que até mesmo as cores a repudiavam, era raiva de um filme mal feito sobre um povo perdido. O grito saiu destruindo todas as raivas do mundo, no mais, eu estava orfão de mim mesmo. E bateu-se a última tecla. Fim.

15.3.10

PAISAGEM NUMERO 3 (PARTE 1)

O sol sumia no horizonte, a areia esfriara e o mar subira um pouco. Na solidão completa daqueles dias lá estava o sol se pondo, lá estava a vida acabando, lá estava a morte chegando, lá estava... Anoitece tão lentamente que posso ver o céu se tornando cada vez mais escuro, posso ver o acender de cada estrela e o sibilar silencioso da vida. Não há passado nem futuro e sim um caminho que me leva ao grande nada. Em casa há uma grande escuridão. Os livros estão espalhados pelo chão, café caido, garrafas quebradas, caos. Há caos em tudo, há tudo em caos e se não houvesse um pleno caos nas coisas nada faria sentido. Sem dormir, sem comer, sem sorrir. O expelho não existe. Caio em uma imperfeição completa. Não sofro mas tambem não minto. A noite não apareceu hoje como aparece todos os dias. O sangue que escorre nas ruas da cidade molha todos os bueiros e mendigos, mas hoje havia algo diferente. Um brilho sinistro cobria toda aquela mancha escura, esta noite havia sim algo diferente, um som, um cheiro, um toque, uma visão, um gosto... CONTINUA...

14.3.10

Bem, os bons morrem cedo já diziam os poetas. Perdemos então alguém que trazia a alegria e o sorriso em poucos traços e grandes ideias. Perdemos um ator da caneta e do papel, perdemos um ser que trazia ao mundo um sorriso entre tantas lágrimas. Perdemos Glaúco Vilas-Boas, um dos maiores cartunistas que tivemos a honra de compartilhar as mesmas terras e o mesmo ar, e enfim, presenciar a Arte!. Não tenho muito a dizer sobre este fato que me chocou. Eu estava acordando quando ouvia débilmente a notícia na televisão. De inicio não acreditei. Eu estava acordando quando ouvi a notícia na televisão. Posso dizer apenas que dou adeus e um muito obrigado por ter enriquecido mais um pouco a nossa arte brasileira! ADEUS GLAÚCO.